Close-up of beautiful jaguar in the jungle. Amazing Wildlife. Generative Ai

A filarmônica do Clima e Gov sob a regência Tech

Você já esteve no meio de uma floresta? De um lado, mata. No outro, também. Densa, esparsa, em copas, onipresente. No meio dessa corpulência em verde, bichos de toda sorte. Onça-pintada – jaguar if you may desire to speak in english – , aranhas, cobras e alguns predadores. Sempre em silêncio. À espreita. Vigiando quem entra e quem busca uma saída da mata.

É uma orquestra. Silenciosa.

(Shhhhh…)

Quebrada por um esturro, por um assobio ou por um serpentear…

(Estruuu… Quiri-quiri… Chirp… Chirp…. Ssssss….)

Mas é uma filarmônica afinada. E afiada.

Entre sons próximos e distantes, o medo do desconhecido dialoga com o sentimento de se estar em casa. É dialético na essência e na prática do dia a dia, porque não é de hoje que ela sobrevive a dias de chuvas torrenciais, calor desértico e frios congelantes. Culpados? Temos. Nosotros!

E a história, você conhece bem: desmatamos essas densas matas, emitimos gases de efeito estufa até não dar mais e por aí o bicho-homem tem caminhado.

Imagem aérea de desmatamento.

Mas há esperança. Esperança numa junção super bem ajustada. A união entre Climatechs e GovTechs. Startups que levam inovação para a área climática e da esfera governamental, respectivamente, sendo que cada qual se vale de investimentos contínuos, tecnologia de ponta e inovação persistente.

Portanto, my friend, foque onde eu foco. Temos uma combinação poderosíssima à mesa. Clima e Gov sob a lógica Tech. Não só no sentido amplo, mas também quando se olha para populações que vivem literalmente dentro das florestas.

Porque no fim das contas, é bom lembrar, a bioeconomia é uma ferramenta de alcance no sentido de imprimir melhor qualidade de vida e geração de riqueza para essas populações, em especial. Mas também não sejamos inocentes. Até porque, por óbvio, só a Bioeconomia não resolve. É preciso f-u-d-a-m-e-n-t-a-l-m-e-n-t-e que os serviços públicos sejam devidamente ofertados.

“A mitigação dos riscos climáticos é uma agenda governamental. Além disso, também é uma agenda do governo enfrentar os desafios de infraestrutura do País”, afirma Adriano Pitoli, Head do fundo GovTech da KPTL.

Nota da Redação: Antes de falar especificamente de algumas startups que brilham nessa intersecção, vamos a alguns números para comprovar sobre o que hablamos. Um estudo da PwC registra que as Climatechs receberam aportes de cerca de US$ 64 bilhões em 2023 no mundo, uma expansão de 70% em relação a 2021. Um ponto importante é que esse aumento se deu em meio a um período de retração global nos investimentos de venture capital. Já o Fórum Econômico Mundial projeta que a vertical GovTech deverá provocar um impacto global de negócios da ordem de US$ 9,8 trilhões até 2034. O estudo também estima uma expansão específica do mercado de GovTechs dos atuais US$ 606 bilhões para US$ 1,4 trilhão nos próximos dez anos.

Como se vê na nota acima, estamos falando de grandes números, e de alto impacto na combinação desses dois campos: GovTech e Climatech. E isso sem colocar na planilha efeitos da já existente lei federal.

Quer um exemplo? i4Sea. Startup baiana especializada em inteligência climática e fundada em Salvador em 2016 por oceanógrafos, a i4sea combina ciência de dados, Inteligência Artificial e modelagem matemática para oferecer soluções hiperlocais que ajudam empresas a gerenciar riscos climáticos. Com um pacote assim, o impacto social e climático que ela pode provocar é imenso. Foi isso que proporcionou à empresa receber, em janeiro deste ano, um aporte de R$ 7,5 milhões liderado pelo Fundo GovTech – gerido pela KPTL e pela Cedro Capital – e também com participação da Polaris Investimentos.

Dinheirinha boa, né não? É, e bem aplicada!

Com tecnologia voltada para traduzir o impacto do clima em operações, recursos e ativos, a i4sea auxilia empresas a prever e mitigar contingências climáticas para reduzir perdas e gerar oportunidades de receita em operações críticas. E tudo isso é feito pela plataforma i4cast, desenvolvida pela startup, que recorre a décadas de dados históricos públicos, proprietários e de Inteligência Artificial para elaborar previsões climáticas hiperlocais e fornecer informações sobre risco climático.

A startup nasceu como uma solução de inovação para o setor portuário, mas rapidinho se ligou que poderia ampliar sua atuação para outros mercados que também sofrem interferência direta das mudanças climáticas. Assim, a empresa evoluiu de uma plataforma focada em otimização portuária, em 2020, para um sistema mais amplo de gerenciamento de risco climático, ganhando destaque pela capacidade de fornecer janelas operacionais com base em informações climáticas com previsões de poucas horas e de até 90 dias de antecedência.

Dessa forma, a startup hoje está pronta para atuar, além do setor portuário, em mercados como o de energia renovável, agro e engenharia civil, áreas diretamente impactadas por eventos climáticos extremos. Um exemplo disso é seu trabalho pro-bono com a Capitania dos Portos de Salvador (BA), onde fornece as janelas ótimas e inseguras para navegação na Baía de Todos os Santos. E esses ajudam na prevenção de acidentes.

“Nosso objetivo é estar na vanguarda da resiliência climática, expandindo nossa atuação para mercados como energia, agro e indústrias”, diz Lima. “Vamos estar à frente de mercados como energia, agro e engenharia civil, além de promover a expansão internacional de nossa atuação no setor marítimo. O desafio climático já é agora, não no futuro”, reforça o CEO da i4sea.

Venture capital, ajudando a dar liga no rolê

Além da i4Sea, o portfólio da KPTL conta com outras startups que fazem o meio de campo entre duas áreas, conforme destaca Zelinski. “Um exemplo é a Fractal Engenharia, que ajuda Belo Monte, por exemplo, a usar os recursos hídricos de maneira mais eficiente, gerando mais energia, ou Santa Catarina, apoiando a Defesa Civil”, diz.

Fundada em 2010, em Santa Catarina, a Fractal Engenharia de Sistemas tem como foco a chamada “inteligência climática”. Trocando em miúdos, a empresa usa dados hidroclimáticos para entender a dinâmica da água num determinado território. Com isso, consegue apoiar a tomada de decisão e mitigar os riscos de empreendimentos de empresas e, claro, ajudar a sociedade de maneira geral, pois muitas pessoas sofrem na pele os problemas com inundações e eventos climáticos extremos.

Fractal Engenharia na sala de controle. (Foto: Divulgação)

Para explicar de um jeito ainda mais fácil, a startup consegue fazer previsões de chuva no nível do detalhe, permitindo saber exatamente que áreas estão sob risco de alagamento. “Além de trabalhar com o excedente hídrico, os nossos sistemas trabalham com o déficit hídrico, o que nos permite estimar qual vai ser a severidade de uma seca ou por quanto tempo deve durar um período de estiagem”, diz Henrique Rocha, fundador e CEO da Fractal.

Esses exemplos demonstram a importância de conectar os pontos entre a gestão pública e a agenda climática, mostrando que existem startups bem posicionadas nessa área. E isso não é pouca coisa, porque, como já falamos, a humanidade teve a capacidade (e bota capacidade nisso!) de bagunçar beeeeem o coreto do clima, o que tem resultados em eventos extremos cada vez mais frequentes, prejudicando pessoas, empresas e cidades. É preciso dar um jeito nisso. E rápido.  No ritmo da batuta do maestro.

“Qual o melhor dos governos? Aquele que nos ensina a governar a nós próprios”

Johann Goethe

3 perguntas para…

Tatiana Schor

Chefe da Unidade de Coordenação Amazônica do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), onde lidera o Amazônia Sempre, programa de coordenação regional para a Amazônia do banco.

(Foto: Divulgação)

1) Qual a visão e os pilares centrais da estratégia do BID para a Amazônia? O que norteia as ações do banco para a região?

Em 2023, os governadores do BID de sete países amazônicos (Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru e Suriname) apoiaram o estabelecimento do programa Amazônia Sempre, que é coordenado pelo BID por mandato dos países. O Amazônia Sempre promove ampla colaboração entre as diversas partes interessadas, incluindo países doadores, bancos multilaterais de desenvolvimento, comunidades indígenas, organizações da sociedade civil e os setores público e privado. O programa é baseado em cinco pilares: (i) Combate ao desmatamento e fortalecimento do controle ambiental e da segurança no contexto dos governos nacionais; (ii) Bioeconomia e economia criativa, promovendo atividades econômicas alternativas e sustentáveis; (iii) Pessoas, visando acesso adequado à educação de qualidade, saúde e emprego; (iv) Cidades sustentáveis, infraestrutura e conectividade; e (v) Agricultura, pecuária e silvicultura sustentáveis ​​e de baixo carbono. Além disso, concentra-se em promover a inclusão de mulheres, povos indígenas, afrodescendentes e comunidades multiculturais; clima e conservação ambiental; e reforçar as capacidades institucionais e o Estado de direito.

2) Como a estratégia do BID para a Amazônia se articula com a realização da COP30 no Brasil? Quais ações a instituição planeja para este ano tendo em vista a conferência?

Para celebrar esta que é a primeira COP na Amazônia, o BID está liderando iniciativas e parcerias para apoiar o aumento das capacidades dos países amazônicos e escalar o impacto positivo. A COP30 é uma oportunidade de tomar ações concretas em direção a uma Amazônia mais sustentável, também por meio da expansão do nosso Programa Amazônia Sempre. Além de financiamento, o BID oferece um conjunto de metodologias, princípios e abordagens para implementar projetos de alta qualidade que visam ampliar o impacto e mobilizar capital privado para a América Latina e o Caribe. O Banco e outras instituições multilaterais de desenvolvimento estão trabalhando como um sistema para gerar maior impacto, incluindo o reforço de plataformas nacionais para apoiar as nações em seus objetivos climáticos. Isso melhora a coordenação e a alocação de recursos, garantindo a implementação eficaz dos compromissos climáticos e acelerando o progresso em direção às metas climáticas nacionais e globais. E o BID está impulsionando o alinhamento de investimentos em clima e natureza, colocando a interdependência entre clima e biodiversidade no centro de sua estratégia institucional – BIDStrategy+, suas operações, políticas e inovando para mobilizar financiamento para projetos de adaptação e resiliência na América Latina e no Caribe. A COP30 é uma grande oportunidade para que os países da região avancem em políticas que apoiam mutuamente o clima e a natureza bem como aumentar os investimentos e a implementação de programas na Amazônia.

3) A senhora já defendeu em artigos a necessidade de mudar o foco da economia extrativista para uma abordagem de bioeconomia na Amazônia. Qual o papel da inovação das startups e do ecossistema de venture capital para acelerar essa transição?

A Amazônia oferece características ecológicas e sociais para que os produtos e serviços da bioeconomia prosperem, e a bioeconomia oferece um modelo alternativo e transformador que se centra no uso sustentável da terra. Por conseguinte, a bioeconomia e a conservação da Amazônia estão intimamente ligadas e são interdependentes. A bioeconomia não deve ser vista como a única solução para o desenvolvimento sustentável da Amazônia, ela em si não resolve as questões sociais e de desenvolvimento da região, mas temos muitas evidências da sua capacidade de impacto positivo socioambiental na região. Quando bem articulada com estratégias e investimentos que permitam ao território desenvolver capacidades para diversificar as atividades econômicas e reter o valor dos produtos finais, têm o potencial de reverter o desmatamento, aumentar a sua resiliência climática, proteger a biodiversidade e as comunidades locais, apoiando também o patrimônio cultural importante para a manutenção do ecossistema. Para isso, a inovação é essencial para o desenvolvimento de novas tecnologias e processos que possibilitem o uso sustentável dos recursos naturais, baseados na biodiversidade amazônica, como medicamentos, cosméticos e alimentos funcionais. Além disso, a inovação pode melhorar a eficiência do uso dos recursos e reduzir o impacto ambiental das atividades econômicas. As startups são motores de mudança e podem rapidamente trazer e escalar essas inovações, novas ideias e tecnologias para o mercado. Na Amazônia, elas podem beneficiar as comunidades locais, atraindo investimentos e gerando empregos, contribuindo assim para o desenvolvimento econômico sustentável da região. É preciso promover ambientes propícios à inovação para prosperar e acelerar essa transição, por exemplo de dinamizadores, aceleradoras, incubadoras, mas também o venture capital que fornece os fundos e redes necessários para que as startups e outras empresas inovadoras possam crescer e desenvolver os seus projetos.